Esta página é reflexo do meu preparo enquanto me graduo.

Documento posicionamentos pessoais e informações relevantes para apresentar o serviço de psicoterapia no futuro, quando me graduar.

Ressalto que a prática da psicoterapia não é prática privativa ou exclusiva de psicólogos, conforme a declaração categórica do CFP no lançamento da resolução 13/2022 sobre a prática da psicoterapia por psicólogos. A prática da psicoterapia, portanto, na legislação, pode ser exercida livremente por psicoterapeutas e terapeutas tanto como por psicólogos, mas não me intitulo terapeuta, ou psicoterapeuta, ou psicólogo, e nem presto o serviço de psicoterapia.

Sinta-se à vontade para falar comigo nos botões de WhatsApp, só quero deixar claro que ainda não atendo.

A linguagem em alguns textos, e verbos no presente, como: “utilizo”, “faço”, “penso”, “entendo”, “contrate-me”; podem levar à interpretação de que no presente exerço a função, mas coloco esta tarja para esclarecer este ponto também. Estes textos são construídos de forma a apresentar uma página em versão final, justamente para que esteja pronta quando me graduar, além disso representam minha posição atual frente aos assuntos, porque também há uma função documental para mim escrever sobre minha trajetória e mudanças de ideias ao longo do tempo.

Sentido da vida

Pietà

Qual é o verdadeiro sentido da vida?

Por que ter uma filosofia de vida, um significado para a vida?

A profunda mensagem de Jordan B. Peterson

Eventualmente todos nós perguntamos: qual o sentido da vida? Se nossas vidas têm algum significado.

Quando estava analisando o livro 12 regras para a vida, de Jordan Peterson, entrei em uma profunda reflexão sobre o que é que o autor queria dizer em suas meditações. Especialmente as passagens mais carregadas simbolicamente, mais poéticas.

Não sei se era mesmo a intenção do autor, mas cheguei à algumas conclusões por meio dele, que mudaram profundamente minha concepção sobre fé, significado e sentido para a vida.

Especialmente, foi a sétima regra, que mais penetrou no meu espírito e motivou minha busca pela compreensão da mensagem do autor.

Busque o que é significativo (Não o que é conveniente), afinal o que significa algo ter significado? E colocando esta regra no pináculo da hierarquia de valores, ou seja, aplicar na vida como um todo, me levou a pensar: O que é uma vida significativa?

A proposta desse texto é explorar os questionamentos mais profundos da humanidade a respeito do que é significativo. A base e inspiração é a regra 7, do livro de Jordan B. Peterson. A tese central é que o ser humano enfrenta desafios colossais em sua vida, como os fardos existenciais: sofrimento, futuro, morte, mal, liberdade e a própria consciência. Viver sem refletir sobre tais aspectos da vida, pode adicionar muita dor desnecessária para a alma de uma pessoa, assassinar sua fé e esperança na vida. E viver sem significado e direção, é um mal negócio…

Este é um convite para que escolha viver com responsabilidade. Ter um significado por trás de suas escolhas.

O fardo da consciência

O fardo da consciência

Eventualmente percebemos a Natureza da vida, a indiferença da existência, o absurdo. Se formos do tipo questionador e sensíveis para perceber coisas além de nós mesmos, vemos o sofrimento do mundo, o mal no mundo. A nossa própria dor, revela muito também.

A aventura pode começar quando finalmente refletimos, o que vou fazer diante de tudo isso?

O aspecto aparentemente caótico da Natureza, a injustiça no mundo, o sofrimento inevitável e as questões fundamentais da filosofia, e da religião, são condições perturbadoras demais para um espírito inquieto. É preciso buscar respostas.

O fardo da existência não é trivial. Temos uma imensa consciência, que nos tortura com o que é capaz de ver: o sofrimento, nossa insuficiência, o futuro, a morte, o valor externo, o bem e o mal, a corrupção e injustiça.

Poucos têm a coragem para de fato investigar se há sentido na vida, sem cometer o suicídio filosófico. Antes de nos render à apatia ou à revolta, vamos tentar nos aprofundarmos no problema.

A vida é sofrimento, o que fazer com isso?

Vamos morrer, afinal o que fazer em relação à nossa finitude?

Somos limitados, egoístas, invejosos e envergonhados. Como nos atrevemos a ousar fazer algo?

O futuro é incerto? Existe destino? O que fazer hoje, com nossa consciência limitada, para descobrir o futuro?

Às vezes, as coisas dão errado. O que fazer diante dessas adversidades, especialmente quando adotamos a responsabilidade?

O mal existe, e nos afeta. Como lidar com ele, enfrentá-lo e vencer?

Não pense você que responder essas coisas são apenas para exercitar a mente e fazer filosofia. Não confrontar sinceramente essas questões significa não articular sua filosofia de vida, não se comprometer com a coerência e não afiar sua consciência para te guiar diariamente.

Nossa consciência não veio pronta, treinada e com a habilidade de nos guiar com maestria rumo ao que é certo, ou ao que é bom. Ela precisa de refinamento, e eis a razão para a maioria das pessoas temerem, profundamente, enfrentar seus conflitos pessoais mais agudos:

Uma consciência que acesse uma Verdade maior, é atraída por ela. A consciência é um Juiz, capaz de torturar uma pessoa que conheça o que deve fazer, o que é certo, o que tem valor, se ela se recusar a atender seu chamado.

Uma das obras mais eloquentes sobre esse aspecto da consciência é Crime e Castigo, de Dostoievsky. Conta a história de um estudante que escolhe cometer assassinato, porque não crê em Deus, nem na moralidade convencional, se enxerga como alguém autorizado a desrespeitar a lei e a tradição de sua cultura. Mas ao cometer o ato, descobre que não se conhecia tão bem assim, e embora não tenha sido capturado, sofre imensamente por seu crime. Seu principal inimigo, sua consciência. E por ser intolerável o julgamento dos próprios pensamentos, o protagonista desse romance escolhe a confissão e a penitência. Crê que se julgado, condenado e preso, será uma liberdade maior do que estar sujeito à sua consciência expandida e violada.

Veja, esse momento é uma espécie de toca do coelho para o mundo das maravilhas. É um momento de escolha, pílula vermelha ou azul.

Conforme uma pessoa refine sua consciência, ela se torna mais poderosa para ‘persuadir’, para nos forçar a sermos coerentes com o que já descobrirmos ser verdade.

Esse é o risco de saber.

Mas não pense você que não existe também um risco de não saber, de continuar optando pela inconsciência. Pare agora, porque conhecer o perigo de viver de olhos e ouvidos tapados já te leva para o primeiro risco.

Gato

Mergulhando na Matrix

Todos nós temos medo da morte, queremos o prazer e a segurança. Temos também uma aversão ao trabalho, ao sacrifício e à responsabilidade. Preferimos a conveniência e a simplicidade. É sofrido fazer investimentos de longo prazo, abrir mão no presente de algo bom para algo melhor no futuro.

Racionalmente, faz sentido optar pelo sacrifício quando entendemos o princípio do nosso investimento, e mesmo neste caso, ainda é difícil controlar nossas emoções e optar pela gratificação tardia.

Imagine agora, na hipótese de não sabermos sequer como funciona o nosso investimento no futuro. Imagine nossos antepassados criando o conceito de sacrifício aos Deuses. O sacrifício não era um ato racional, mas um ato de fé. Sem certeza, sem entendimento.

Por que será que existiu essa necessidade? De sacrificar?

É porque eles perceberam o que você percebeu também: O fato do sofrimento. Perceberam que viver sem considerar o futuro, é viver uma vida muito difícil, até se tornar insuportável e exigir do homem uma resposta melhor.

Pensa aí – viver assim não dá, tem que haver uma alternativa melhor!

E então, inventaram o sacrifício.

Supersticiosos, como hoje somos também, imaginaram que Deus, ou a Natureza, exigisse respeito às suas leis, até então desconhecidas, para liberar o próximo nível da vida. Na revolução da agricultura, o homem percebeu que a natureza tem um ritmo para dar os frutos de uma colheita, ele não poderia impor sua vontade. Então, teve que negociar com a natureza. Aprender as leis ocultas, o funcionamento do universo.

E por extensão, negociar com Deus – A personificação da crença básica de que era possível barganhar com a vida, sacrificar e pagar um preço por algo desejado. Por algo melhor.

Só que temos mais um problema, que você também percebeu. É um negócio sem contrato, e a exigência do provedor do que desejávamos nem era conhecida. Pode-se dizer que o homem enlouqueceu, e estava falando sozinho, e queimando seus bens de maior valor para as nuvens, mas eis a surpresa. Às vezes ‘funcionava’, ou pelo menos a crença fazia com que o homem enfrentasse a dificuldade de cumprir sua parte do acordo, e por consequência de seus esforços sinceros e interessados, a vida florescia e as coisas prosperavam mais. Às vezes…

O homem meio que resolveu a charada: para o sofrimento, sacrifício.

Se aprendermos a controlar nossos impulsos, termos responsabilidade e foco, podemos colher uma vida muito melhor do que viver sem nenhuma ‘filosofia de vida’, sem nenhuma responsabilidade ou significado. Nem sempre funciona, mas às vezes. Se todos colaborarem é cada vez mais provável que possamos construir uma vida melhor.

Mas! O problema maior surge quando as coisas não dão certo, muitas vezes, e sequer sabemos o porquê. Se Deus existe ou não, neste caso não importa, as pessoas acreditaram na barganha, fizeram sua parte – ao menos objetivamente –, mas o sacrifício não surtiu efeito.

Essa crença, fez com que aqueles que o acordo não funcionou irem tirar satisfações. Não sabemos se Deus respondeu, ou simplesmente a decepção foi tamanha que o homem passou a se ressentir com a realidade, a limitação dessa ideia ‘injusta e arbitrária’.

A inveja e a vergonha são naturais e universais, se esses sentimentos são alimentados nos tornamos capazes de atrocidades, e quando sentimos revolta e alimentamos ressentimento, conhecemos o que acontece também: A vingança e o desejo pela destruição.

Quando o sacrifício deu errado, o sujeito alimentou ressentimento, invejou e decidiu se vingar e destruir. Escolheu matar, deliberadamente. Trouxe à existência, sofrimento desnecessário. Mesmo o homem responsável, na qual o sacrifício deu certo, foi derrotado pelo mal. Apenas o sacrifício e a responsabilidade não bastaram para melhorar a vida. O mal triunfa sobre isso.

Essa foi a história de Caim e Abel, no antigo testamento.

Por que te contei essa história?

Porque o perigo de não a conhecer, é grande. Há pouco disse que se manter na inconsciência tem riscos também, e um dos principais motivos está exposto de modo fundamental.

A inconsciência te deixa ingênuo, despreparado para lidar com a maior ameaça da vida, não o sofrimento, mas o mal. Além disso, há o perigo natural já discutido antes, de não saber lidar com si próprio: vergonha, insuficiência, inveja, ressentimento e revolta. Isto é, se tornar um contribuinte para o sofrimento da vida, é se tornar o mal, se o fizer já sabendo que poderia ter sido mais forte e evitado isso.

O risco de não expandir a consciência, e ter um significado para a vida, uma filosofia estruturada de vida, é temer a morte. É subjugar a liberdade à necessidade e aos impulsos, de ter tudo imediatamente, o prazer principalmente, e ouvir o medo e a covardia que te aconselham a se anestesiar e fugir da dor e do sofrimento.

Se observarmos nosso passado, da humanidade, vemos logo que os bem-sucedidos sacrificam, expandem a consciência, mesmo que pouco.

Não ter significado, nos condena a ser escravos de impulsos. E eles não são bons mestres. Sem essa filosofia de vida, vem outra provação difícil de ser enfrentada também: o valor da vida frente a morte. Nossa consciência sabe que vamos morrer, e quer uma resposta: Como vamos lidar com isso capitão?

Albert Camus abre sua obra, o Mito de Sísifo, assim:

“Só existe um problema filosófico realmente sério: o suicídio. Julgar se a vida vale ou não vale a pena ser vivida é responder à pergunta fundamental da filosofia.”

E então, qual o sentido da vida? Se não tiver, vamos cortas os pulsos e acabar logo com isso.

Difícil uma questão como essa sem antes ter refletido um pouco sobre a vida. Ter encontrado valor em suas experiencias. Pense nos nossos ancestrais mais uma vez, que assim como nós perceberam: o sofrimento, o futuro, a morte e o mal. E ainda tinham que conviver com uma consciência maior do que tinham condição de suportar.

Nada mais salutar que ignorar questões difíceis no processo da evolução da moral, mas estamos aqui agora. Enfrentando essa questão…

Por que não se matar?

Adicione isso também em sua reflexão:

“Se Deus não existe, tudo é permitido.” – Irmãos Karamazov de Fiodor Dostoievsky

Será que Deus existe? Se existe, Ele determinou um destino para a humanidade? E se tudo está determinado temos mesmo livre arbítrio? Seria então meu suicídio pré-determinado e nem responsabilidade sobre esse ato tenho? O universo não é só um fenômeno aleatório, e assim sendo, a vida também o é? Um acidente sem significado ou propósito?

E para nós aqui, por que escolher a responsabilidade, fazer o sacrifício, se nada tem sentido? Mesmo que dê certo e a barganha com a realidade funcione.

De modo mais profundo: por que escolher a nobreza, junto à responsabilidade, para enfrentar o mal (O que é muito mais desafiador), se nada tem sentido? Se o universo é indiferente à nossas ações e intenções subjetivas?

Em resumo, se você não tiver um posicionamento ‘suficiente’ para sua consciência, ela vai te matar, vai escolher o suicídio.

E que posicionamento é esse?

O significado que você atribui à sua vida, os propósitos que você se dedica, sua filosofia de vida, sua escolha de enfrentar a vida – dada as percepções de sua consciência e sua capacidade de elaborar sua resposta.

Reflita ainda, sem sua filosofia de vida estabelecida, e sua lealdade a ela sincera e firme, imagine as tentações do mal que te prometem o prazer e os desejos animalescos, se você empregar seus dons para seus fins perversos. Por que não aceitar a oferta? Se nada faz sentido, se nada tem significado, por que é ‘errado’ aceitar a tentação do mal?

Contando que não seja nós que paguemos a conta, absorvendo essa dose extra de sofrimento que o mal impõe ao mundo… Eu aceitarei a oferta, vou ser um crápula.

Não pense que o mal não é sofisticado. Ele é capaz de se vestir de bom cidadão, ser eloquente e falar sobre justiça. Suas tentações são sutis, seus esquemas elaborados, normalmente pega quem não tem consciência refinada. Mas quando encontra ‘solo fértil’ em uma pessoa niilista e que respondeu à pergunta fundamental da filosofia e não escolheu o suicídio, as proporções de seus efeitos são cataclísmicas para a humanidade.

Os fardos existenciais

Então, diante da necessidade do significado, vamos nos aprofundar para descobrir nossos valores, e articular nossa filosofia de vida, de modo a conciliar nossa consciência com a realidade de modo coerente, e sensato. Não será fácil.

O fardo do sofrimento

O fato do sofrimento

O primeiro desafio, o fardo do sofrimento, nossos antepassados encontraram uma resposta.

A alternativa da serventia aos nossos impulsos mais egoístas é o sacrifício, basicamente a disciplina da responsabilidade. O treinamento da consciência para regular os impulsos e honrar compromissos, com a sociedade, com a natureza.

A tese que temos é que o autocontrole, e a responsabilidade, pode construir modelos confiáveis o suficiente para erguer uma cidadela, protegida contra as ameaças do presente e do futuro, até certo ponto. Ao aprendermos a nos dedicar, podemos armazenar trabalho e colher frutos maiores que apenas o trabalho da sobrevivência, com foco em recompensas imediatas.

Mais uma realidade precisa ser compreendida também. A consequência de uma vida sem compromissos é a falta de direção. Sem o alvo, o homem apenas vagueia, pulando de galho em galho, e isso destrói seu espírito ainda mais do que apenas a dureza da vida. A falta de direção, é uma consequência da não escolha pelo sacrifício, e ela destrói o homem e piora sua condição.

O fardo do tempo

A negação da morte

O segundo desafio, vem logo após a escolha da responsabilidade. É preciso tolerar o sofrimento de aguardar, de se dedicar, de sacrificar. É o problema do futuro, o intervalo entre a escolha e o sucesso, ou de maneira mais radical, o intervalo entre a escolha e a morte. Essa é a distância máxima de nossa visão. Mas uma questão por vez…

O futuro, como lidar com isso?

Haverá sofrimento, escolhendo a responsabilidade ou escolhendo a conveniência. Novos questionamentos pertinentes também surgem: Você acredita em destino? Um plano divino para sua vida? Ou acredita no acidente cósmico? Para sempre aleatório e imprevisível, por vezes agraciando-nos com boa sorte, outras vezes com devastação imprevisível?

Nosso amigo Seneca, o filósofo estoico, nos trouxe alguns raciocínios muito úteis quanto ao nosso conflito com esse fardo existencial. Ele defende que quando confrontamos adversidades, buscamos conselhos, e o oráculo mais próximo é a filosofia.

Ter uma filosofia de vida, dedicar-se ao desenvolvimento da consciência e da moralidade, do caráter, à expansão do conhecimento sobre a realidade, é uma escolha que pode nos oferecer exatamente os conselhos necessários quando a existência impuser seus limites e condições.

A filosofia, o guiou a escrever sobre o futuro e a necessidade de se desenvolver na filosofia, da seguinte forma, respondendo às perguntas feitas.

“Mesmo que estejamos emaranhados com a lei inexorável do destino, seja porque os Deuses criaram tais leis para governar todas as coisas, ou talvez seja o caso de todos os assuntos da humanidade serem determinados de forma embaralhada, caótica e aleatória, é a filosofia que tem o propósito de nos proteger. Ela irá nos encorajar a nos submetermos aos Deuses com alegria e honra, e nos submetermos à Fortuna com resiliência. Ela irá nos mostrar como seguir aos Deuses e como suportar o que a chance enviar em nossa direção.”

– Trecho da carta XVI, de Seneca

Esse é um raciocínio prático, e extremamente útil diante do desafio do futuro. Talvez seja a filosofia, a clara hierarquia dos nossos valores mais profundos, colocando o que é significativo em nossa vida no topo dessa pirâmide, que nos resguarde da angústia e da ansiedade. Ambas nascidas da consciência com sua profunda visão da realidade e do futuro ‘visível’.

Ao percebermos, que em todos os casos, diante de destino, diante de livre arbítrio, diante de aleatoriedade, ainda enfrentaremos o fato de estarmos vivos, logo tomamos consciência da importância de desenvolvermos uma atitude inteligente, articulada e clara.

A honra na responsabilidade, a nobreza diante do sofrimento, a aceitação radical da realidade, a plena consciência da estreiteza de nossa visão e a clareza sobre a parte negativa da apatia e da vulgaridade nos servirá para elevar nossa resiliência. E até mesmo a felicidade.

Ao amadurecer nosso caráter, crescer nossa tolerância e aprofundar nossa humildade, ficamos cada vez mais imaculados contra o ressentimento, o desejo de revolta, a profunda tristeza diante de um sacrifício rejeitado ou ao sofrimento intrínseco da vida.

Uma atitude salutar e inteligente, é perceber a ausência de significado de cultivar e ruminar sentimentos que não nos servem para construir uma vida melhor que a condição original. De processar nossas emoções efetivamente, para que nos sirvam aos nossos propósitos, não envenenem a mente e a alma.

O futuro, para sempre é um destino melhor que o presente. É por isso que fazemos qualquer coisa, mesmo que o horizonte de tempo seja curto. É evidente que os pensamentos de Seneca, porém, não resolvem todo o problema: viver apenas no futuro significa viver para sempre ansiosos.

Sua contribuição foi acalmar nosso espírito questionador a respeito de destino e a aleatoriedade do universo, convence nosso eu prático, utilitarista, que avalia as opções conhecidas de ações, e decide que projetos vamos nos engajar e o porquê. Faz sentido, cultivar uma filosofia de vida: Nos ajuda a ter dignidade na hipótese de haver um plano divino, ou nos ajuda a ter resiliência na hipótese de a vida não ter propósito intrínseco – que a vida seja um acidente. Em ambos os casos, estar vivo diante do futuro, requer uma atitude – a melhor, é ter um caráter forte para enfrentar o que quer que se apresente diante de mim, quando eu cruzar o portal do tempo.

Precisamos resolver o presente também, se pretendemos acalmar nossa consciência. Viver no passado, ruminando ressentimento ou revivendo o prazer, nos condena. Viver apenas pelo futuro, sem nunca olhar para trás, nos cega. Ultimamente nos condena também.

É preciso haver um relacionamento harmônico com o tempo, para processar a realidade com assertividade e tranquilidade verdadeira para a alma. Essa conciliação precisará de apoio das nossas respostas a outros fardos.

Como nos relacionamos com o presente, quando estamos envolvidos de modo responsável pelo futuro? Como conciliamos também, a memória do passado em nossas escolhas presentes, e escolhas de direção rumo ao futuro?

Viktor Frankl, renomado psiquiatra e sobrevivente do holocausto nazista, relata em seu tocante livro Em Busca de Sentido, que os prisioneiros dos campos de concentração que não tinham esperança para o futuro, logo pereciam. Também conta que as pessoas que perdiam o senso de individualidade, que passaram a acreditar que eram apenas corpos escravos, também caíam.

Sem perspectiva de libertação e vida, os prisioneiros se concentravam em reflexões retrospectivas. A vida perdeu o sentido. Sabendo do fim, ali naquelas condições, o passado perdeu o valor de guardião da vida, mas os que perseveraram cultivando alguma esperança, sobreviviam além.

Por vezes, à espera de alguém amado, um reencontro significativo – um relacionamento ou experiência. Outras, um trabalho inacabado, escolhido livremente – um feito a ser completado. O importante é que o ser humano precisa estabelecer uma ligação de comunicação dos três tempos – passado, presente e futuro. Se essa linha for rompida, em breve, a ruína.

Aquele que vive apenas com o presente e o futuro, cai. Aquele que vive apenas com o passado e o presente, murcha. É preciso uma crença conciliadora. Uma redenção, uma aspiração… uma esperança.

Frankl também reflete, como Seneca, a respeito da necessidade de desenvolver a atitude frente ao fardo do futuro. Diante do sofrimento inevitável, resta ao homem modificar a si próprio, ter uma atitude honrada e resistir ao seu lote de sofrimento com nobreza.

Seneca recomenda a filosofia com antídoto, Frankl o significado. Ambos recomendam uma atitude diante do que está fora de nosso controle: Rir de volta para a morte, cultivar a reverência com nosso Deus ou a resiliência diante do acaso. Se está fora de nosso controle, ou mesmo influência, resta-nos retornar à nós mesmos e desenvolvermos nosso caráter para encontrar a força para viver além. E não meramente sobreviver.

“O homem é capaz de tornar o mundo melhor se possível, e mudar a si mesmo, se necessário.”

O fardo do mal

Além do bem e do mal

Vimos, porém, que apenas a resposta para o sofrimento e o tempo, não bastam. O mal triunfa sobre nossa ingenuidade e estreiteza de visão. Como lidar então com o fato do mal no mundo?

O primeiro pensamento útil para encarar isso, é uma definição do mal. Jordan Peterson em sua jornada conheceu por meio de Aleksandr Solzhenitsyn, em sua grande obra Arquipélago Gulag, o tribunal de Nuremberg, que chegou em uma conclusão sobre a prática de tortura:

Há algumas ações tão intrinsecamente terríveis que podem ir contra a própria natureza do Ser humano. Transformar a dor em uma forma de arte, isso é errado. Essas são más ações. Não há desculpa que justifique tomar parte delas. Sofrimento por sofrimento de forma engenhosa é maligno, através do tempo e do espaço, em todas as culturas.

Então, o psicólogo canadense afirma:

“Se o pior pecado é torturar os outros simplesmente pelo sofrimento – então o bem é qualquer coisa diametralmente oposta a isso. O bem é qualquer coisa que impede tais ações de acontecer.”

O mal então é a gênese do sofrimento pelo sofrimento. O bem a defesa da vida contra o sofrimento desnecessário. O bem é uma atitude generosa e gentil, mas forte e decisiva para lavar o sofrimento do mundo.

Incorporar o valor do bem, no comportamento, é estabelecer na alma o axioma:

Com o melhor das minhas habilidades agirei de forma que alivie dor e sofrimento desnecessários.

Ele é um estado e é uma mentalidade ao mesmo tempo. Somada à consciência sobre a alternativa, experimentada muitas vezes no passado, esse axioma redime eternamente o passado. Escolher não ferir, diariamente, nos força a estar sempre conscientes que o sofrimento é ruim, e que já causamos muito desnecessariamente, não precisamos mais voltar lá, aprendemos com isso, só é preciso que nos lembremos. Sermos vigilantes.

Outra história milenar que nos ajuda a lidar com esse desafio, é a história de Cristo. Especialmente as interpretações de John Milton, em o O Paraíso Perdido e o Paraíso Reconquistado, e a grande obra final de Fiodor Dostoievsky, Os Irmãos Karamazov, quando Aliocha e Ivan conversam nos capítulos A revolta e o Grande Inquisidor.

Essas obras, encare como herança da tradição e da cultura dos nossos ancestrais. Elas encenam e exploram as questões humanas, como as que levantamos aqui, de modo profundo e trazem uma perspectiva poderosa para que possamos elaborar nossa filosofia de vida, e descobrir nossos valores para ultimamente vivermos uma vida significativa. Ultimamente, essas obras nos ajudam a elaborar uma resposta ao fardo do mal.

No evangelho de Mateus, Jesus Cristo enfrenta 40 dias no deserto e 3 tentações simbólicas do espírito do mal. De certa forma, na narrativa bíblica, Jesus é a segunda tentativa humana significativa contra o fardo do mal.

A primeira foi a história de Caim e Abel, que termina com a morte de Abel, assassinado pelo irmão Caim. Abel fez sacrifícios, escolheu a responsabilidade, mas foi destruído pelo mal, nascido no coração do irmão.

Dessa vez, é Jesus Cristo que representa a humanidade em seu eterno confronto com o mal. E dessa vez, o homem vence. O Cristo é tentado pelo mal, a renunciar a seus valores, de sua fé. Em última análise, de seu significado maior, o sentido de sua vida.

Cristo teria se tornado novamente Caim, se tivesse falhado. O mal corromper o mais justo dos homens, significa a destruição da humanidade, de Abel. O lado humano responsável, de intenção pura.

No primeiro caso, o mal não venceu somente porque Abel foi morto. A morte faz parte da vida, Abel apenas representou o sucesso da descoberta do sacrifício e da responsabilidade. Da atitude nobre, da intenção pura.

O mal venceu quando Caim não foi capaz de superar seu desejo de vingança, de processar seu ressentimento e angústia. O ‘herói’ da história é Caim, depois foi Cristo. É com esses personagens que precisamos empatizar e compreender, eles são nós.

Apenas a responsabilidade falha, porque o mundo, a humanidade, não prosperará enquanto apenas os que o sacrifício for aceito por Deus, ou pela Natureza, forem bem-sucedidos.

A superação do fardo do mal, representa a capacidade humana de ressuscitar diante das vicissitudes negativas da vida, e reestabelecer o equilíbrio no coração humano. Quando a ordem for imaculada no coração do homem, quando ele for capaz de se relacionar bem com a vida, é quando o homem terá encontrado a chave para lidar com o fardo existencial do mal.

Cristo é tentado três vezes, o teste agudo para o limite da força de seu caráter, especialmente quando em condições desfavoráveis, 40 dias no deserto. Psicologicamente no deserto da alma. Há uma interpretação na psicologia que a água representa os sentimentos e emoções, tendo isto em vista, supõe-se que o deserto da alma seja a ausência de emoções e sentimentos. O confronto com a racionalidade fria e implacável, nosso filósofo interior – niilista, afiado, articulado, cético, trágico, pessimista, arrogante e egoísta.

Cristo não cai diante das tentações, ele triunfa sobre o mal. O significado salva o homem do desafio colossal da existência. A salvação de uma pessoa frente ao obstáculo mais perigoso da vida, é a integridade e força de suas convicções, não por dogmatismo, mas profundo autoconhecimento e entendimento sobre a realidade.

Afinal, na jornada de desenvolvimento do caráter, são necessárias a humildade permanente e a atitude de aceitação radical diante dos fatos e revelações da realidade. Uma filosofia de vida estruturada, feita com cuidado e reflexão, se fundamenta sobre a Verdade. É exatamente a convicção em algo verdadeiro, a edificação do significado sobre rocha firme, que permite a integridade mesmo frente aos terremotos, adversidades e tentações do mal.

O fardo da morte

Vida após a morte

Em frente, o fardo da morte.

Como lidar com o fato de a consciência ser capaz de perceber a própria finitude da vida?

Aqui, novamente foi um estoico que ofereceu iluminação sobre a questão, o imperador filósofo Marco Aurélio, embora ele mesmo não se considerasse um filósofo, mas um praticante de filosofia. Em suas Meditações, no segundo livro, parágrafo XI, ele escreve:

“Em tudo o que fizeres, disseres ou pensares, lembra-te de que está sempre na tua mão o poder de te retirares da vida. Se os deuses existem, não tens nada a temer em te despedires da humanidade, pois eles não deixarão que te aconteça qualquer mal. Mas se não há deuses, ou se eles não se metem nos assuntos dos mortais, o que é a vida para mim, num mundo desprovido de deuses ou desprovido da Providência? Os deuses, contudo, existem, e preocupam-se com o mundo dos homens. Deram-nos o poder suficiente para não cairmos em qualquer dos males absolutos; e se houvesse verdadeiro mal nas outras experiências da vida, eles teriam providenciado nesse sentido também, para que estivesse na mão de todos os homens evitá-lo.”

Novamente, o pragmatismo estoico nos coloca diante da clareza de que mesmo que a alma não seja imortal, que Deus não exista, não devemos sentir a angústia de perder algo valioso, pois sem Deus, ou a imortalidade da alma, a vida não teria valor algum e, portanto, não deveríamos sofrer por medo da morte, de perder algo valioso.

Algo interessante da filosofia estoica é sua aceitação radical sobre a impermanência das coisas e a aceitação do destino e da mudança.

Marco Aurélio, principalmente, insiste muito na finitude da vida, da memória, na transformação dos elementos. O corpo sendo constituído de elementos fundamentais, logo retorna ao pó, como a antiga história do velho testamento. A mente, ele acreditava acontecer o mesmo, se transforma e continua o processo de mudança a partir de onde veio. O corpo veio do pó e ao pó voltará, a mente não sabemos da procedência, mas observando a Natureza, sabemos que continuará o processo de mudança permanente.

Corpos morrem, voltam a terra, e outros corpos são constituídos. A vida permanece mudando. A mente, ele crê, ocorre o mesmo. Nasce, retorna à origem, e é reconstituída novamente sob nova forma. Talvez não no sentido Kardecista, do espiritismo, mas simplesmente no sentido de ciclos de transformação da natureza, reorganização dos elementos nos corpos físicos e mentais.

Na hipótese da existência dos Deuses, da Providência, do Axioma fundamental da benevolência do Universo, morrer é participar do plano cósmico, e isso deve ser bem-vindo.

Na hipótese da existência de Deus, mas com distanciamento dos assuntos mortais, significa também ir adiante, para outro contexto não-humano, retornar à Deus.

Na hipótese do Caos absoluto, a vida não é valiosa a ponto de despertar tristeza pela nossa morte. Não perdemos nada importante, que tenha mesmo valor.

Aqui temos um problema, se a vida não tem valor, a ponto de termos até certa indiferença em relação à morte, por que não retornar então a questão fundamental da filosofia de Albert Camus, o suicídio?

A resposta vem da própria conclusão de Camus. Podemos recorrer a apatia, ao suicídio filosófico e apenas ignorar o fardo da insignificância da vida no universo, ou podemos adotar a aceitação radical da falta de significado intrínseco e aproveitar a vida, não hedonisticamente, mas criando nós mesmos o significado para nossas vidas. Essa foi aproximadamente a mesma conclusão de Nietzsche, ao propor o super-homem, criador dos próprios valores.

É claro que C. G. Jung, fundador da psicologia analítica, e Viktor Frankl, pai da logoterapia, objetariam essa tese, afirmando que o homem não é capaz de criar seus valores e significados. Mas descobri-los é outra história…

A escapatória da possibilidade da aleatoriedade e ausência de significado é essa:

É arrogância presumir que apenas com nossa visão e racionalidade presentes, somos capazes de fazer um julgamento absoluto sobre o universo. Logo, a salvação da vida vem pela curiosidade de se descobrir os próprios valores, estabelecer fé na significância de suas escolhas e expandir sua visão sobre o universo e a vida.

O suicídio filosófico é a escolha de interromper a vida, afinal, que filósofo recusaria conhecer o desconhecido, e o preço para tal ser: viver a vida com um espírito questionador e investigativo no vasto universo?

Aceitar a insuficiência de nosso conhecimento, e cultivar a esperança de desvendar o significado da vida, é vencer o fardo da morte. Mais uma vez, o significado nos protege do fardo existencial.

Viktor Frankl, sobre isso, também contribui ao escrever que a escolha pela responsabilidade pela própria vida, de viver sinceramente, na essência, é o significado em si da vida.

“A questão não qual é o sentido da vida. Mas a vida em si perguntando a você qual é o sentido da sua vida, neste momento. A resposta só pode ser oferecida pelas suas ações, ou seja, sua própria vida é a resposta para o sentido que a vida questiona.”

Sua autonomia, e escolha pela resposta, é o sentido. Ser apático e irresponsável para responder a grande pergunta que a Vida fez para ti, é perder o sentido. Ser responsável com a própria vida então, é ter encontrado o sentido para a vida. Agora, e sempre.

“As escolhas humanas devem ser ativas ao invés de passivas. Ações pessoais ativas afirmam a autonomia do ser.”

Expandem o espírito e amplificam a visão sobre a Vida, liberta de sua pequenez, ilumina mais profundamente o desconhecido, fora e dentro.

Isso alivia o fardo, mas não endereça a angústia animal do medo de morrer.

Afinal, há alguma forma de conviver com o fato da finitude da vida?

A escolha de Sócrates, ao ser condenado em Atenas, consagrou seu nome na história, e revelou um homem capaz de vencer o medo da morte por meio da compreensão profunda sobre a vida e a morte. Tendo ele sido fiel à sua consciência durante sua vida, ela o salvou dessa angústia.

Ao perceber a vida no exílio e na velhice, ele percebeu que tinha sido presenteado com a oportunidade de morrer com dignidade, e em sua total sinceridade interior, sua consciência autorizou a escolha pela morte no seu julgamento. Seus pupilos objetaram sua decisão, mas foram acalmados e instruídos sobre essa grande descoberta: O significado de sua vida, quando profundo, é capaz de dar-te a paz para morrer, livre da angústia do arrependimento e do medo da morte.

Nesse ponto, considero pessoalmente que Sócrates fez um julgamento absoluto, de que o exílio seria lastimável na velhice, mas tendo sido uma escolha e não um evento selecionado pela existência para ele, creio que visceralmente fazer a escolha consciente de morrer, tendo vivido sinceramente é válida.

Isso também me serviu para refletir sobre a mudança permanente do próprio sentido da vida, o que é significativo para nós não é estático, ou violaria a lei fundamental da Natureza.

Mais uma vez, foram Viktor Frankl e Marco Aurélio que ofertaram sabedoria sobre a questão. O imperador romano afirmando sobre a necessidade de manter a flexibilidade conforme o amadurecimento do caráter. A rigidez, em sua visão, viola a natureza humana, que deve cultivar a razão, ou a filosofia, e sempre aceitar a verdade que é revelada pela experiência. O mais importante, porém, é que a flexibilidade seja acompanhada de honestidade real no mundo subjetivo. Não é relativização de valores, mas humildade permanente e disposição para alterar as lentes que se enxerga o mundo em um momento específico.

Imagine um questionamento para um mestre de xadrez:

“Diga-me, mestre, qual é o melhor movimento do mundo desse jogo?”

Como é possível dizer? Sem conhecer o adversário e a posição das peças, os próprios recursos e conhecimentos do jogador?

Essa anedota foi usada por Frankl para retratar o fato da impermanente natureza do significado. Não há uma frase mestra, que sintetiza para sempre a orientação de uma pessoa em busca do que é significativo para ela, mas há sempre alguma frase no topo de sua hierarquia de valor. Ela deve estar sempre atenta a isso, o que significa dizer que ela sempre deve estar atenta ao momento e circunstância que vive, o acesso que têm aos próprios recursos e como ela está conectada à humanidade inteira naquele momento.

O fardo da liberdade

O sentido da vida
As tentações de cristo

Muito bem, refletimos sobre os fardos da existência: a morte, o mal, o futuro, o sofrimento e a consciência. Percebemos também nossa insuficiência, a vergonha, a vingança e a inveja.

Um dos aforismos de Schopenhauer sobre falácias, para enfrentar aquele comentário – ‘Uma coisa é a teoria, outra é a prática’, nos é muito útil agora. O filósofo alemão diz que se há um buraco entre a teoria e a prática, é porque a teoria é incompleta ou incorreta.

Ao desenvolver uma poderosa e bem articulada teoria sobre nossos valores, invariavelmente em algum momento deixamos de honrá-la. Cristo pode ter sido firme, mas nós somos meros mortais.

Freud disse uma vez que Os Irmãos Karamazov, de Dostoievsky, é o melhor romance já escrito. Em outra ocasião, afirmou que Dostoievsky é a voz do sangue. Uma das mentes mais influentes da história do estudo da psique humana admirava enormemente a capacidade do autor russo de penetrar na mente do leitor, e dar voz e articulação aos seus questionamentos mais profundos e individuais, do tipo que raramente compartilhamos. É talvez, por isso, que as obras de Dostoievsky causam tanta comoção nas pessoas que mergulham em suas reflexões.

É na experiência de enfrentar as nuances escondidas, particulares e individuais, que podemos descobrir como ligar os pontos. Nas reflexões que fizemos, estudamos vários ‘pontos’, mas conectá-los, e vencer os buracos entre eles com pontes e conexões válidas para você, significa completar a teoria que conversa com a prática integralmente.

Digo isso, pois no final de nossa conversa, quero deixar uma sugestão perturbadora…

O Grande Inquisidor, em os Irmãos Karamazov, descreve um monólogo de um cardeal com a figura de Cristo, a respeito do fardo da liberdade. Em síntese, ele quer afirmar que o homem não é como o filho de Deus. A tribo humana é falha, imperfeita, egoísta e fraca; destituída da força de caráter que Cristo possuía, e assim sendo, não conseguirá fazer como ele fez, serem cristãos. Resistirem às tentações.

Nietzsche afirmou categoricamente em seus escritos que o cristianismo só teve um único fiel verdadeiro até hoje, o próprio Cristo. O que reforça a tese do cardeal do autor russo. Te convido a conhecer essa história na grande obra de Dostoievsky, esta cena em particular, e adicionalmente o capítulo anterior a este, A Revolta. Isso irá ajudá-lo a entender a última questão.

O questionamento é o seguinte, adotando a perspectiva otimista sobre Deus e a fé verdadeira no transcendente e propósito intrínseco na existência:

Se Deus existe, o fardo moral sobre o homem irá esmagá-lo.

A liberdade, após a libertação do dogmatismo e verdadeira conquista do autodomínio e independência disciplinada, requer imensa força de caráter. Tanto Dostoievsky quanto Nietzsche concordam que é necessária uma fase de dogmatismo para se construir a liberdade plena do homem, mas quando ela for conquistada virá o desafio que dobrou a humanidade.

Poderia o homem suportar a liberdade? Com leveza e tranquilidade?

Retornando ao início de nossa reflexão, será que fizemos uma mal negócio? Desenvolver uma filosofia de vida, encontrar significado, embora tenha inúmeros benefícios, não custa muito caro? Mais do que possamos pagar?

A única chance que vejo para a humanidade diante da possibilidade proposta, é que o homem finalmente entenda que não. Ele não suporta o fardo moral caso Deus exista, não sozinho…

O homem precisa perceber que a vida não é individual, não se trata da sua vida. A vida preenche vários corpos, somos recipientes de uma dose do elixir. Somos integrados, participamos de todo; Nossa família, comunidade, cidade, nação, planeta. Devemos fazer as pazes com nós mesmos, nossos amigos, e especialmente os inimigos. Se os deixarmos de fora, do grande projeto humano, eles um dia virão destruir o jardim, erguido com suor e responsabilidade.

A fratura do espírito humano poderá ser restaurada, enquanto houver homens dispostos a continuarem tentando. Continuarem lutando pelo Bem.

Frankl diz que a autorrealização só é possível de acontecer por meio da autotranscedência, ou seja, a dedicação do homem para um projeto além de si próprio. O significado, a transformação e a felicidade, são efeitos colaterais de uma escolha por um projeto maior. A fé, a esperança de conciliar a existência, o absurdo e a vida plena.

Talvez o significado do sofrimento seja transformar o homem, até que ele transcendendo sua natureza, escolha ser o mensageiro para seus irmãos dos aprendizados ofertados pelo sofrimento à sua alma, agora grande e generosa. A dor transformará os homens em adultos, capazes de guiar seus filhos e inspirar a juventude a atravessar com dignidade o portal do tempo.

Apenas com verdadeira nobreza, a fé interna e sincera – afinal uma pessoa pode realizar todos os atos morais sem crer verdadeiramente neles –, o homem poderá experimentar viver no outro lado do abismo. Realizar o salto de fé descrito pelo dinamarquês Sörën Kierkegaard, de encontrar a outra margem do rio.

Alguns jogos só podem ser jogados, se o jogador decidir imergir seu Ser por completo na experiência. Fé, eis o mistério do mundo…

Esperança

Um sentido para a vida

Após a longa jornada, enfrentando algumas das questões existenciais mais angustiantes do ser humano, qual é a conclusão?

Bem, primeiro ao percebermos o que fere a alma, o perigo da inconsciência e de não escolher amadurecer, fica claro que um significado irá oferecer proteção contra a própria natureza humana. Além disso, ao desenvolver o caráter ficamos mais resilientes diante do sofrimento e do que a vida nos apresenta. Por fim, nossa filosofia de vida aprofunda nosso relacionamento com nós mesmos e consequentemente culmina em maior autodomínio.

Ao aceitarmos a humildade profunda, e desenvolvermos aceitação radical diante da realidade e da Verdade, começamos a viver em constante atenção e aprendizado. Isso nos torna vigilantes, nos faz ver o mundo sem tanta inocência, afinal conforme amadurecemos nosso conhecimento sobre nós mesmos, aprendemos mais e mais sobre a natureza do mal. A empatia vem acompanhada da malícia. Sabemos conduzir a nós mesmos, sermos sinceros e abraçar a mudança, com isso aprendemos a dialogar com a alma das pessoas, não apenas com as máscaras sociais que usam.

A sabedoria de quem buscou o autoconhecimento é refletida na habilidade de identificar o que é universal na experiência humana, e não apenas os pontos de transformação, mas o que significa os sentimentos e atitudes mais comuns, e para onde conduzem o espírito.

O propósito de se desenvolver uma filosofia de vida é adquirir magnanimidade para o espírito, disciplina para controlar o corpo e a mente, e coragem para lidar com a natureza humana e o caos do universo.

A morte perde seu poder de intimidar, com significado forte e sinceridade pessoal, somos capazes de conduzir a vida com sabedoria e neutralizar o arrependimento – compreendemos nossa limitação e desenvolvemos disciplina para nos conduzir à ação dedicada ao objetivo que investimos nossa energia, objetivo este que para nós representa a livre escolha final – o que gostaríamos de ter feito antes de morrer, o que escolhemos fazer e tivemos a coragem de buscar.

Além disso, o medo de perder a vida não nos intimida, pois vivemos nosso sentido, nossa filosofia. Incorporamos em nossas ações, intenções e pensamentos aquilo que mais fez sentido em nossa sincera busca. Mesmo que o universo não tenha propósito, descobrimos e criamos o nosso próprio propósito, diariamente valeu a pena viver. E caso o universo tenha propósito e Deuses, temos a humildade necessária para termos gratidão pela graça divina que nos levará adiante, e revelará o que a morte esconde. Por fim, também compreendemos a Natureza, que a morte é apenas uma parte do processo de transformação permanente. A natureza não é mal, e segue o fluxo natural – ordenado, equilibrador.

O sofrimento foi ressignificado, como portal para o amadurecimento e engrandecimento da alma humana. Percebemos que estamos conectados, com toda a humanidade. E nosso sofrimento serve para nos tornar fontes de inspiração e aprendizado para as próximas gerações.

Descobrimos que uma vida sem responsabilidade e comprometimento, é uma vida sem direção e busca do prazer irrestrito. Leva ultimamente a ruína da alma, à bestialidade infeliz – pois a consciência permanece viva e protesta contra nossa falta, intensificando nossa vergonha e sentimentos negativos. A rota alternativa é o sacrifício, o adiamento da gratificação e o autodomínio para realizar objetivos, especialmente aqueles que promovam a vida. Aprendemos que a intenção importa, o foco e crença verdadeira em seu sacrifício, em sua responsabilidade, farão você descobrir as chaves para construir algo novo, antes inacessível para seu eu escravizado por impulsos.

O futuro foi explorado também, sabemos que sendo aleatório ou determinado, precisaremos enfrentá-lo, com responsabilidade ou perdidos, estaremos vivos e diante das provações da vida e da nossa consciência. Precisamos de nossa filosofia de vida, de responsabilidade compromissada com uma missão significativa, pois diante da lei do destino criada pelos deuses para governar todas as coisas precisaremos de reverência e gratidão, e apenas um espírito disciplinado é capaz de regular o orgulho, ou se não for este o caso, precisaremos de resiliência e força para suportar o que o Caos aleatório lance em nossa direção. Seja o futuro determinado ou aleatório, devemos nos tornar aptos para suportá-lo.

Refletimos sobre a hipótese de a vida não ter sentido, e se é razoável cometer suicídio. Percebemos que o suicídio, até onde podemos saber, encerra a possibilidade, e dessa forma é uma atitude arrogante. Não podemos julgar absolutamente o universo, sem conhecê-lo. Mesmo que haja apenas Caos, precisaremos descobrir isso com nossa experiência e investigação. O suicídio, também é um suicídio filosófico. Percebemos que mesmo sem sentido no universo, podemos descobrir sentido em nossa vida – investigando nossos valores, e vivendo de acordo com eles.

Percebemos que precisamos nos relacionar bem com o tempo. Viver apenas no futuro e ansiosos, é uma má escolha. Apenas no passado, murchamos. Quando aprendemos sobre a morte da esperança, percebemos que a ideia do futuro é necessária para uma criatura dotada de consciência. Se já soubéssemos nosso fim, o passado e o presente não teriam sentido, o espírito humano sucumbe à reminiscência e ressignificação do passado se não houver esperança de realização do que se aprende e reflete no presente e no futuro. Existe uma linha que conecta os três tempos – passado, presente e futuro -, e devemos protegê-la.

Viver no presente é uma tarefa difícil, mas é o antídoto para muitas de nossas angústias e contradições da experiência humana. Ao compreendermos que somos estranhos para nós mesmos, e que precisamos constantemente nos observar e aprender sobre nossas almas, ficamos atentos às mudanças e a extensão de nossas capacidades e campo de visão, física e metafórica. Essa humildade, de viver se autoconhecendo, diariamente, nos protege de traçar metas e objetivos irreais, de ficarmos ansiosos desnecessariamente.

Além disso, quando analisamos a natureza do mal, que é a gênese de sofrimento por sofrimento, percebemos que o bem é a defesa contra isso. Viver atento ao sofrimento, e sempre buscando inserir um modo de viver que forneça proteção contra o sofrimento desnecessário, reativa nossa atenção no tempo presente, ao mesmo tempo que redime permanentemente o passado. Aprendemos que o exercício do mal é ruim, e não precisamos mais voltar ao aprendizado do passado. Nossa atitude, de buscar o Bem, nos mantém atentos no presente, conscientes do passado e esperançosos para o futuro.

Podemos não saber o que é o melhor projeto para o futuro da humanidade, e sabemos que utopias não existem, mas ao fazer o nosso melhor, tornamos nossa ordem um pouco mais imaculada e habitável. Basta o fardo do sofrimento, vamos ser agentes da sabedoria e lavar o mundo do fardo do mal.

A última provação serão as tentações do mal, que aprendemos que é possível resistir à elas. Com a força de um caráter desenvolvido e refinado. Com um significado construído em rocha firme. Só seremos capazes de resistir ao mal, com extrema maturidade moral e consciência sobre a realidade. Nossos impulsos são fortes, e precisamos entender de modo profundo as razões pelo qual temos o significado que descobrimos, o porquê de honrar a filosofia de nossa vida.

Por fim, observamos que a liberdade só pode ser suportada, se for carregada por mais de uma pessoa. Somos uma unidade maior que apenas nossos corpos e mentes, precisamos de todos para sustentar nosso espírito enquanto vivemos a jornada humana.

Toda a reflexão nos serviu para responder às difíceis perguntas da consciência, onde ela sozinha não pode intuir o caminho. Mas embora sejam as grandes questões que ocupam os filósofos, são ações diárias que constroem significado e valor concreto.

O próximo passo da jornada, é desenvolver sistematicamente o caráter. Refletir sobre o que você acredita, perceber o que te interessa, ser verdadeiro. Nenhum valor que não seja compreendido profundamente pela alma, pode ser invocado pela consciência para cumprir os projetos da inteligência humana.

Comprometa-se, acima de tudo, à evolução do seu caráter. A filosofia que desenvolver para sua vida te dará os conselhos que necessita para atravessar a vida e a morte com magnanimidade. O maior dos sacrifícios e responsabilidades, é o compromisso permanente com o projeto vago, mas real, do Bem maior. Mirar alto, buscar o melhor, a Verdade, é estar sempre atento a mudança, e estar sempre transformando-se.

Abraços!

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